terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Morreu duas vezes

Pedro voltava do enterro de Eduardo. No cruzamento da Avenida Brasil com Celso Malcher encontrou Joana com várias sacolas de compras.
- Você não recebeu noticias de Eduardo?
- Para mim ele morreu faz seis meses, disse a donzela.

Acabou o chorare

Manoel descia a Rua da Independência quando encontrou Rufino bêbado, com uma garrafa de cachaça na mão, caído na calçada em frente à casa da Glória Brito. Tentou ajudá-lo, não quis, apenas resmungou:
- Ela não me ama mais.

Folia & Cinzas

Começa na quarta-feira do fogo. Termina na quarta-feira de cinzas. No Pelourinho, Praça Castro Alves, Campo Grande, Avenida Sete, da Barra até Ondina tudo é alegria. São milhões nas ruas da capital da Bahia. Trios elétricos, abadás e pipoca todos em uma só sintonia. O nome disso é carnaval.

Se essa rua fosse minha...

Aquela rua de piçarra, hora agitada, hora pacata, está presente em muitas das lembranças de um tempo feliz onde o futuro confundia-se com o infinito. As pedras naquela terra amarela nunca foram incômodas para nós. A nossa criatividade fizera daquele quarteirão mais que um pedaço de rua. Nosso campo de futebol; nossa entre linhas das queimadas que animavam o fim de tarde; nosso salão de festas ao luar, agitadas por nossas cantigas de rodas e sintonias corporais; espaço de disputa para chutar bem longe aquela garrafa verde de água sanitária e salvar os amigos capturados na pira bojão. 

Era na rua que desafiávamos a física, uns tentando derrubar velhas latas de óleos com uma bola pequena, outros as defendiam com pedaços de madeira, às vezes cabo de vassoura, que carinhosamente os chamávamos de tacos.

As nossas pipas eram exibidas no céu, coloridos papéis de seda e um lindo rabo feito com fitas k-7 sem uso sonoro. Percorríamos ponto a ponto do quarteirão. Nossas linhas enroladas em latas de leite eram jogadas por cima da fiação elétrica, nada era obstáculo para manter no céu nossas lindas rabiolas. Qualquer desaforo era resolvido no ar, o vento e os urubus eram as testemunhas de nossas disputas para ver quem tinha o melhor cerol. Como era emocionante ver a pipa do outro ser levada para longe e a molecada com os olhos de gavião descobrindo o sentido do vento, correndo desesperados para pegar aquele papagaio que não tinha mais dono, nem linha, nem cerol.

Em tempo de copa do mundo, aquele pedacinho da Travessa Tembéns ganhava uma decoração especial. Muros pintados. Tirinhas da cor da bandeira nacional eram penduradas de um lado ao outro. No dia dos jogos do Brasil, todos se reuniam na garagem do vizinho, mas a comemoração do gol era na rua. Todos saiam das casas para comemorar, gritar, bater panelas, fazer a festa. Contudo, era na rua que também brigávamos. Vira e mexe rolava aquele atrito típico dos adolescentes e o lugar certo para resolver tal dilema era lá, na rua. Era lá que também fazíamos as pazes com abraços e apertos de mãos.

Nosso quarteirão também era palco de devoção e fé. Todas as noites do mês de maio íamos com a Santa em seu andor, enfeitada com rosas naturais e um manto azul, andando, rezando e cantando, levar a padroeira dos paraenses a um novo lar. As velas proporcionavam uma iluminação especial e os hinos de louvores um som diferente daqueles gritos emitidos por nós durante nossas animadas partidas de futebol: passa a bola “delegado”; foi falta filha da puta; a bola é nossa...

Também, fazíamos questão em dividir nosso pedaço de chão com os santos juninos. Santo Antônio, São João e São Pedro ganhavam inúmeras fogueiras. Passávamos a tarde catando madeiras e todos queriam fazer a maior fogueira. Todos ganhavam com a disputa, pois à noite, as fogueiras acesas apresentavam um espetáculo sem igual. No meio da rua, juntos às fogueiras, girávamos a vareta com a palha de aço e estourávamos nossas bombas. No fim do ano, era a vez de São Benedito ter passagem garantida com seus fiéis, seus instrumentos musicais e suas bandeiras vermelhas tremulando no ar.

O lado profano também tinha presença garantida. Os bregas do passado como “Por que brigamos”, cantado por Diana, aprendi sentado a beira da rua. Todo fim de tarde, em um cabaré localizado no fim da nossa rua, um alto-falante alumínio tocava as velhas canções que ainda hoje guardo em minha memória. Em algum ano de década de 1990, não estou lembrado o ano exato, a Escola de Samba Paraíso da Alegria iniciou seu desfile quase em frente à minha casa. A escola de samba tinha um enorme dragão como abre-alas, seguido por um carro alegórico onde duas moças, uma loira e uma morena, sem nada para cobrir os seios, dançavam abraçadas em um jovem vestido em uma pequena tanga. A bateria da escola de samba era pequena, mas suficiente para empolgar os foliões que sambavam animados com o ruído da cuíca, a batida do pandeiro e do tamborim.

Lembro o dia em que passei a primeira vez no vestibular, em 1999. Ao gritar minha aprovação no curso de Geografia, na Universidade Federal do Pará, bati com a mão três vezes seguida na rua, agora asfaltada. Outros vestibulares foram comemorados, podemos afirmar que esse quarteirão é o que mais aprova universitários em nossa cidade, é a verdadeira apoteose dos calouros.

No outubro passado, quando estive em Ourém, fiquei olhando a nossa rua e lembrando todos esses momentos maravilhosos. Os adolescentes de hoje não são como os de nossa época, nem em quantidade, nem em qualidade. Algumas coisas permanecem como os espaços dedicados aos santos em maio, junho e dezembro. A copa do mundo parece que não empolga mais, não vi nenhum muro pintado, os políticos ocuparam os muros deixados de lado pela seleção Dunga. O asfalto substituiu a piçarra, cobrindo as pedras, a terra amarela, as marcas de nossos pés, a história da minha geração que hoje passeia pela rua buscando as impressões de um passado não muito distante, que foi capaz de moldar uma concepção de mundo que carrego comigo junto com todas as memórias acima descritas.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Poesia

Poesia, alma, arma
Versos feitos nos lençóis da cama
Que deitastes comigo para não dormir...

Poesia, nome sem sobrenome,
Coisas que não cabem na vida...


Poesia, fuzil, foice e metralha
Da multidão que passa
Tecendo um manto de idéias vermelhas.
Luz, grito e silêncio,
O sol, a chuva,
E a savana indomável de teus cabelos
Que entrelaçam em meus dedos...


Poesia... Dos barracos do morro
As cenas proibidas da “paz civilizatória”
Do preconceito racial da PM carioca...


Poesia, este amor de mim por ti
Que mistura o desejo 
De usarmos a boca para o beijo
E para a revolta
De haitianos, pobres e negros...


E de usarmos o corpo
Como dois espectros nus e suados
Colados um ao outro,
Mas também como escudo
De um partido para revolucionar o mundo!


[R.T]

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Por dentro da câmera escura

A cortina cinza é embalada pelo sopro do vento que passeia pelo fim do dia. Na janela aparece uma mulher com vista para o leste. Sua ida à janela foi rápida quanto à passagem do vento. Mal pude ver o rosto da mulher e seus cabelos pretos. Rapidamente, a moça fecha a janela. A cortina cinza acalma-se sem se despedir do vento. Uma ruptura brusca, tanto quanto a ruptura da mulher com o horizonte o qual não pode alcançar.

Ao baixar a vista, vi uma senhora com cabelos castanhos amarrados e um sorriso solto no rosto. Cercada por pessoas simples como ela, aquela senhora ajudava a revelar, em meio ao cenário artificial da moderna arquitetura, um cenário real e humano. Diferente da mulher do prédio luxuoso, do apartamento decorado com a cortina cinza, essa senhora sentada em um banco de ferro da parada de ônibus, não olhava para o leste, não buscava nenhum horizonte, só queria ir para casa.

Em meio ao congestionamento, carros, motocicletas, bicicletas e seres humanos. Estes últimos passavam despercebidos. A buzina é a pequena notável neste momento. Uns motoristas confundem sua função de alerta. O som emitido não tem o poder de retirar um carro parado à sua frente. Eu tenho muita fé e esperança que um dia os condutores dos veículos irão descobrir a verdadeira função da buzina e, com certeza, os congestionamentos serão menos estressantes. Enquanto esse dia não chega, a ignorância continuará reinando no espaço entre carros engarrafados e o ser humano continuará passando despercebido, no anonimato.

Na pressa da cidade, com seu ritmo acelerado, sempre correndo contra o tempo, as coisas mais óbvias, podemos dizer, as coisas mais simples, são apagadas do nosso campo de visão. O nosso olhar é construído, condicionado a não ver o óbvio. Dois meninos esforçavam-se no sinal de trânsito para serem percebidos. Somente gritar não basta. É preciso gesticular, mais que isso, é preciso apelar ao malabarismo. Assim fizeram, literalmente. Um subia na costa do outro e tentava, em posições e movimentos extravagantes, executar malabarismo com dois pedaços de madeira com as pontas decoradas com fios coloridos. A cada sinal fechado, o espetáculo era executado. Mesmo com a exuberância, o coração gelado do homem individual não era tocado. Poucos tinham sua sensibilidade remexida. Agora eu pergunto: quantos desses que por ali passaram e depois de assistir o show de malabarismo refletiu sobre a vida dessas duas crianças? O que as levou às ruas? O que significa a palavra futuro, ou melhor, a palavra vida para essas duas crianças? Os carros, as motocicletas, as bicicletas passam e seus condutores pensantes já não pensam mais. Enfim, são condicionados a não pensar e sim impulsionados pela pressa de chegar, só não sei onde. Até agora o ritmo imposto tem nos levado a lugar nenhum.

Segui meu percurso dentro da câmera escura procurando ver o mundo que me cerca de uma outra forma daquela imposta pela sociedade da individualidade e do coração gelado. Procurei ver coisas as quais sou impedido de ver, analisar e compreender. Busquei captar cenas, imagens e momentos com outro foco. Descobri que podemos sim ver o mundo para além da pressa, do ritmo acelerado, dos carros engarrafados, da buzina irritante.

Pare um dia. Entre na sua câmera escura. Escolha as verdadeiras imagens do seu mundo. Garanto a você, este é um bom exercício.

domingo, 18 de julho de 2010

Você está em CaZuZa

17 anos de vida.
Mas, não estou perdido,
Sei onde está o meu umbigo
E onde mora o inimigo.
Sei com quem quero juntar os trapos

Com essa Mulher Vermelha,
Esse vermelho sangue
Que mancha o branco do dente
E vai parir um novo filho
Sem o homem-níquel

Mas posso também casar com teus homens
Porque no teu balaio
Só não vale ficar parado.

Vou te deixar virada,
Saia desta vida de migalhas
Desses homens que te tratam
Como um vento que passou
Deixa eu te levar então
Pra onde eu sei que a gente vai brilhar,
Em Citté Soleil ou em Gaza, lá é tua praça!

Você pode até se demorar a me encontrar,
Mas aos 50, eu tenho apenas 17
E ainda estou pintando o sete
Mas se você achar
Que eu tô derrotado...
Dias sim, dias não
Eu vou sobrevivendo sem um arranhão
Da caridade de quem me detesta
Eu vejo o futuro repetir o passado
E sou capaz de ferver na tua boca
Cravos e Maios
E uma nova Primavera de Praga
Eu posso: um ano de 89 mudado!

Minha sede de viver é uma ameaça atômica
Capaz de fazer aquele garoto que queria mudar o mundo
E ficou em cima do muro,
Pular nos teus braços, sem medo, sem cansaço!

Por que você me olha com esses olhos de loucura?
A burguesia fede
Enquanto houver burguesia
Não vai haver poesia
E quando nos sobrar só à pele,
As ruas serão tuas, Mulher Vermelha,
Tua grinalda é esta bandeira sem fronteira
Nadando contra a corrente...

Me dê de presente o teu bis
Outubro que sempre quis
Me dê de presente o teu bis
Outubro que sempre quis

Vem ouvir Cazuza comigo
Para ele nos ensinar
Que os perigos dos jornais
Não estão nas páginas policiais
E que não é a doença que faz o doente,
E que o inverso é a cura, é a luta:

Vamos pra rua
Vamos pra rua
Vamos pra rua
Vamos pra rua

A Cazuza eu só pediria:
“Imagine no possessions” (imagine não existir posses)
Não me surpreenderia se ele conseguisse,
Porque o “bom burguês”
Foi o único erro de sua poesia!

[R.T]

______________________________
Homem-níquel: Adequação de Burguês-níquel, de Ode ao Burguês de Mário de Andrade

Músicas usadas: Mulher Vermelha, 17 anos, O Tempo não pára, Burguesia, Lobo mau da Ucrânia, Preconceito, Pro dia nascer feliz. E uma frase da popular Imagine de John Lennon: Imagine no possessions.

Em, “... um novo filho...” – Filho – faz uma apologia ao Estado, que é produto da disputa entre as classes, portanto, filho dessas, essa construção foi de Atnágoras Lopes que escreveu em uma poesia de sua autoria.

sábado, 26 de junho de 2010

A cidade

O tempo controlado pelo semáforo. Habitantes sem referencias. Andar apressado. Olhar distante e frio. Tudo era diferente, estranho e novo para um menino que acabava de chegar do interior.

Sua visão de cidade quase homogênea, onde todos se conhecem por nome, onde fazem rodas de conversas na portas das casas, é bruscamente substituída por um ritmo onde as pessoas perdem a identificação com o lugar e com as outras pessoas.

O menino que gostava de andar descalço, sentir o chão frio de sua casa e terra fina do seu quintal, aquele que subia em arvores, assistia a dança das folhas ao embalo do vento, foi morar num edifício de 22 andares, no apartamento 804. Adeus quintal, arvores, pés descalços. Os costumes são outros. Dois elevadores transportam pessoas, as quais nem olham nos olhos das outras. Poucas falam bom dia/boa tarde/boa noite. Quando falam é mais por educação e não por intimidade. É o verdadeiro estar sozinho no meio da multidão. As relações são marcadas pela ausência da comunicação.

Aquele menino, ainda perdido no processo dinâmico da grande cidade, buscou manter traços de seu passado. Às vezes, ia descalço ao supermercado. Os olhares estranhos começavam no elevador, seguiam pela rua e terminavam no supermercado. Com seu jeito moleque, levava tudo na brincadeira.

Aos poucos, o guri da cabeça grande, começou a viajar no mundo numérico: casas, edifícios, andares, elevadores. Buscou inserir-se no novo ritmo, no novo tempo. Passou a acordar com o barulhinho do despertador – pi, pi, pi – o velho galo já não o acompanhava mais na madrugada com seu cantar. A vida passa a ser controlada pelo uso do relógio. Hora do banho, do café, tempo certo para chegar à parada do ônibus. Qualquer descontrole tudo fica fora do lugar. O tempo passa a controlar o cotidiano daquele menino que há alguns dias atrás tinha uma outra concepção de cotidiano e de tempo.

O estranhamento aos poucos foi deixando de ser obstáculo e passou a ser um desafio, algo ser superado, confrontado, descoberto, apreendido. Passou a cumprir o papel de mola mestra. Um impulso que levou o menino dos pés descalços a encontra-se com as grandes avenidas, movimento de carros e pessoas, o agito que a primeira vista parece um caos, mas que ao ser bem analisado revela uma sincronia nos movimentos.

O menino não se contentou com a visão estática da paisagem. Viajou para além das aparências e buscou compreender a máquina e suas componentes. Aos seus olhos, a metrópole tornou-se um espaço de revelação. Ganhou nova forma, nova dinâmica, novos conteúdos. Sua relação intrínseca com a cidade revelou seu amor por Belém (Pará) e pela geografia.

Papel em branco


Máquina de escrever
Papel em branco
Versos que não vem
Papel em branco


Caneta, tinta, tinteiro
Jogo de palavras
Um só fim
Nenhum começo
Papel em branco


Lápis
Outro lápis
Lápis a mais
Versos a menos
Papel em branco


Mente vazia
Coração palpitante
Voz presa na garganta
Sorriso amarrado nos lábios
Beijos algemados na boca
Papel em branco

sábado, 12 de junho de 2010

Do ponto de partida ao ponto de chegada

Gente, muita gente. 7h da manhã. Horário de pico. A placa informativa percurso centro aglutina um número maior de pessoas ao seu redor.

Rostos variados, brancos e negros. Velhos e novos. Todos de uma só classe, a trabalhadora. Uniformes diferenciam estudantes e trabalhadores, mas o ponto de partida, a placa indicadora, não diferencia ninguém. Todos esperam o mesmo ônibus. Uns mais ansiosos que outros. Uns mais preocupados que outros. Não sei se a preocupação era por atraso ao trabalho e/ou estudo, ou simplesmente, pela batalha que logo seria travada – brigar por um assento – afinal, o número de pessoas era superior ao número de bancos daquele ônibus branco com linhas laterais azuis e vermelhas.

Eu também entrei na briga por um lugar ao sol, leia-se, por um banco no ônibus. Acho que por sorte, a porta traseira parou em minha direção. Aí, caminhei ao seu encontro. Está certo, vou confirmar, levei um empurrão básico ao subir, pois se não tivesse levado não teria graça. O mais importante, saí vitorioso na briga. Conseguí sentar.

Infelizmente, dezenas seguiram o percurso em pé. Isso já é vantajoso. Outros não conseguiram entrar. A lei da física é clara, dois corpos não ocupam o mesmo lugar. Assim, os derrotados na batalha matinal ficaram no terminal a espera do próximo round.

Sentei no primeiro banco logo após a porta, na penúltima fila. Pela janela vi a agonia de uma derrotada. Ela não tinha chance nenhuma de vencer, mas lutou. Carregava consigo uma caixa branca com letras azuis que antes guardara um ventilador. Como não estava com a minha “espada justiceira”, sem a minha “visão além do alcance”, não posso afirmar o que tinha dentro daquela caixa. Uma coisa posso dizer, não era um ventilador. O esforço que aquela mulher de rosto cansado fez para deixar a caixa ao chão demonstrou isso.

Além da caixa branca, aquela senhora derrotada no primeiro round, carregava dois rolos de corda de cor marrom amarrados com um fio branco, um aro de bicicleta não muito brilhoso e duas crianças, assim como ela, negras. Sem entender muito a batalha, as duas crianças ajudaram a mãe a colocar os dois rolos de corda e o aro da bicicleta sobre a caixa branca com letreiros azuis.

Aquela mulher qual não sei a idade, muito menos o nome e o endereço, olhou para o ônibus, depois para seus pertences (incluindo os filhos) e pensou. Não sei o que ela pensou. Mas pelo mover de seus lábios falou aos filhos:

- Fiquem aqui.

Em pensamento deve ter concluído:

- Daqui a meia hora vem outro.

E assim esperou. Não sei em qual round aquela mulher, que não tem cara de Maria, venceu a batalha. Não sei que horas chegou ao seu destino. Nem sei se chegou.

Durante o percurso os passageiros foram descendo. O ônibus lotado foi esvaziando-se. Eu e mais quatro passageiros, um homem e três mulheres, chegamos ao final do trajeto. As cadeiras cinzas, antes bastante disputadas, agora sem passageiros. No terminal do Centro de Aracaju estava marcado um novo round. Agora o ônibus fazendo seu itinerário inverso, com novos gladiadores e os mesmos juízes (o motorista e o cobrador), ambos com o mesmo uniforme – camisa azul, calça e sapatos pretos. O que os diferenciava eram as posições que um cada ocupava no interior do ônibus e o nome que exibiam nos crachás.