sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Somos sarará crioulo


Quem sou eu? Vira e mexe faço essa pergunta a mim mesmo. Sou um ser social? Sou um objeto? Sou um assessório? Sei lá. Sou tantas coisas ao mesmo tempo. Flerto por vários mundos, mas, particularmente, adoro passear pelo mundo da música.

O reggae de Bob Marley não seria o mesmo e ele não poderia ser chamado o rei dos rastafáris. Os meninos da Tropicália exibiam suas cabeleiras e as movimentavam ao som do novo ritmo musical. “A cabeleira, cabeluda, descabelada” passou a ser símbolo de uma geração alternativa. Para outros, a cabeleira era suspeita e a pergunta ficava no ar, “olha a cabeleira do Zezé, será que ele é, será que ele é?”. Não sei e também não me interessa.

Nos dias de hoje, enquanto muitos procuram me alisar, me esticar, me cauterizar, me fritar na chapa, Vanessa da Mata com sua voz divina e maravilhosa, faz de mim o seu visual. Com o amarrado que só ela faz, fico mais volumoso. Chamo mais atenção quando ela coloca aquela flor vermelha e seu perfume de sim. Gosto da Vanessa porque ela me aceita da forma que cresci em seu couro cabeludo. Inclusive, com a música, brinca com aquelas, como a sua própria tia, que utilizam o “Joãozinho” ou o famoso bob para alisar as pontas.

Luis Caldas fez sucesso com seu “fricote” por causa de mim. Quem não se lembra da “nega do cabelo duro que não gosta de pentear, quando passa na boca do tubo o negão começa a gritar, pega ela aí”. Pois é, recentemente, as Três Meninas do Brasil chegaram a perguntar musicalmente para nega: “Qual o pente que te penteia? Qual o pente que te penteia, ô nega?”. Arnaldo Antunes entrou na conversa e foi logo rasgando o verbo “quem disse que cabelo não gosta de pente”. Sandra de Sá mandou de lá, em defesa da nega, “a verdade é que todo brasileiro tem cabelo duro, sarará crioulo”.

Na música também sou sentimento. Despertei saudades de um amor vivido, um fio de cabelo comprido que esteve grudando em suores de amor, era a única lembrança deixada no paletó. Saudades, muitas saudades daquela índia, de “seus cabelos negros, nos ombros caídos, negros como a noite que não tem luar”.

Viu? De boca em boca, de música em música, vou ganhando novos significados, novos conceitos. Comprido, cortado, tingido, trançado, escovado, aparado, descolorido, feio ou bonito, seco ou molhado. Múltiplas identidades reveladas ao som da música. Uma única certeza, independente da forma, do tipo, do estilo, sou cabelo. Espero continuar com todo esse sucesso, pois uma coisa posso dizer, não “são dos carecas que elas gostam mais”.