segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Reserva III

Apito, juiz, grama, bola.
Você, fora!

Reserva II

Chuteira limpa. Camisa enxuta. Linha oposta.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Reserva

Pés em repouso.
Sentado, observando, querendo.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Telefone mudo

Cheguei em casa às 21h. Tomei banho, deitei no sofá, esperei o telefone tocar. Dormi sem ouvir sua voz.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

A escrita e a angústia

A sua escrita existencialista revela uma pessoa que busca explicações sobre quem e o que somos, o que fazemos, para onde vamos, o que e quem nos move. Perguntas pequenas que exigem grandes respostas. Respostas nada impossíveis de serem alcançadas por um jovem que se auto-define do tamanho da soma de tudo aquilo que absorve.

Nunca ouvi sua voz. Mas li e senti suas palavras carregadas de um brilho semelhante ao alargador prateado enfiado em sua pequena orelha. As palavras são sua voz, mas sem som. Isso não importa, apesar de ter uma paixão pelas palavras faladas, as suas permitem ouvir uma voz, pode até não ser sua voz, pode ser a voz da palavra.

Blog, diário e livros. Três coisas importantes na vida de um jovem estudante de Letras, da Universidade Federal de Alagoas [UFAL], que trabalha e anda em ônibus lotado como eu. Apesar de sermos separados geograficamente pelo Rio São Francisco, a história construiu uma ponte que os une. Nesse caso, o amor pela palavra – escrita, falada, cantada. Eu cursando Comunicação Social/Jornalismo na Universidade Federal de Sergipe [UFS], ele Letras na UFAL, fomos entrelaçados pela busca de palavras a serem lidas, consumidas, saboreadas, interpretadas e reescritas.

Fomos presos em celas diferentes, no presídio chamado palavras. O alagoano tem Clarice Lispector e Alice Ruiz como parceiras de cela. Machado de Assis e Truman Capote são os meus. Isso não quer dizer que não tenhamos outros amigos, nada disso. Mas a gente sempre tem aquele amigo com quem dividimos nossos segredos mais íntimos. Vira e mexe brincamos de trocar de amigos, mas só por alguns dias. No dia livre, onde todos os presidiários concentram-se no enorme pátio de cores azuis, rodeado de bancos de cimento coberto com uma tinta amarela, vira uma grande feira literária. É um troca-troca de livros, rodas de conversas, debates e mesas de discussão. Um dia de festa que inicia ás 8h e termina ao pôr do sol. Ao voltar para cela, sempre vamos de mãos dadas com os novos amigos que adquirimos durante a feira e com os olhos cheios de lágrimas ao ver velhos amigos irem embora. Uns para sempre, outros por apenas alguns dias, até a próxima feira que rola todas as sextas-feiras.

Como eu e o alagoano estamos em selas vizinhas, nossas conversas e debates são permanentes. Tá aí um vizinho que quero para sempre ao meu lado, apesar de seu existencialismo “meio doentio” que reflete em seu escrita e em sua angústia. Nada que uma dose de Rubem Braga não contorne a situação.   

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Seu Genésio

  Todos os dias, cedo da manhã, Seu Genésio estava na padaria da esquina comendo um pão francês e tomando um café quentinho.
  Hoje, Seu Genésio não estava. O dono da panificadora informou que ele tinha ido conversar com Deus.

Inferninhos

   O provincianismo esconde, ou finge esconder, cenas que são realizadas na calada da noite.
  Por trás daquele lindo paisagismo dos bares da orla, escondem-se inferninhos onde tudo é permitido fazer.
   Foi em um desses inferninhos que conheci Valquíria. Morena, 26 anos, sem nenhum pudor. Sentada à mesa em frente ao balcão, usava um vestido azul, sem nada por baixo. Cruzou as pernas duas vezes, deixando à mostra uma buceta lisa de lábios grossos. Assim, entendi o ditado;
   - Tá no inferno, abraça o capeta!

Súlplica

A lua cheia refletia nas ondas que quebravam na praia. Sônia bebeu mais uma dose de cachaça, caminhou alguns passos e suplicou ao mar:
- Devolva meu pescador.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

O leitor

Da janela da sua casa podíamos ver o reflexo dos raios solares no verde do capim coberto pelo orvalho. Na varanda, uma rede grande e colorida fazia companhia a uma cadeira de balanço branca onde aquele homem sentava para ler livros, jornais e revistas.

Ler era um hábito adquirido desde criança. Incentivado pela mãe, uma excelente professora do primário, trocou os brinquedos típicos da infância por livros, revistas e jornais. O carrinho foi substituído por papel com letras impressas. Na sua casa de campo, mantém uma biblioteca particular com livros de escritores atuais e também algumas obras raras de autores consagrados. Jornais e revistas também fazem parte da sua coleção.

- Ainda hoje, guardo a primeira edição que li do Jornal do Brasil, aos meus 15 anos, na primavera de 1970, quando conheci a Cidade Maravilhosa. Comentou, encaixando seu óculos de aro prateado sobre seu fino nariz, refolhando as páginas meio amareladas de umas antiga edição de “Memórias Póstumas de Brás Cubas” [Machado de Assis].

Os cinco dias que passei em sua casa de campo, observava minimamente os movimentos daquele homem que encontrou nas palavras uma forma de desvendar o mundo e também de desaparecer dele. Quando sentava na sua confortável cadeira de balanço, abria um livro, um jornal ou uma revista, parecia que tudo desaparecia ao seu redor. O canto dos pássaros, o som emitido pelo chocalho da vaca leiteira e o latido dos brabos cachorros não o incomodava. Parecia que estava em transe. Só existia ele e o papel a ser lido, decifrado, devorado.

Quando despertava era para ir ao banheiro que ficava nos fundos da casa, feito de madeira. Uma porta dava acesso ao vaso sanitário alvo como os azulejos que decoravam o interior do ambiente. No chão, tinha um porta-revista de ferro pintado com uma tinta suave quase rosa, pois até nesse momento a leitura estava presente.

Seus olhos castanhos só não degustavam palavras em dois momentos, quando seu dono estava dormindo ou tomando banho. Dormindo eles estavam fechados, esse momento era hora do inconsciente degustar daquilo consumido pelo consciente. Na hora do banho, não lia, cantava. Logo cedo e ao final da tarde, do aposento para banhos, podia-se ouvir sua voz meio rouca e dissonante. Esse era um dos poucos momentos em que o professor não consumia palavras, arrotava.

A leitura era sempre presente. A sua amada, a quem chama carinhosamente “Florzinha”, contou-me em segredo que até na hora da relação sexual, seu amado lia ou declamava a ela poesias. “Florzinha” recitou na íntegra a composição poética lida por ele à primeira vez que fizeram amor.

- Foi no verão de 1975. Ainda cursávamos o curso de Letras na Universidade Federal de Minas Gerais. Tínhamos ido com um grupo de amigos da universidade para Porto Seguro na Bahia.

Calou-se por um instante, olhou pela janela, observou seu amado com um livro nas mãos, cabeça encostada em um travesseiro verde claro com bordados amarelos. Chamou por ele, roubando-o por alguns minutos do seu enlace com a leitura e, com sua voz suave recitou:

Já és minha. Repousa com teu sonho em meu sonho.
Amor, dor, trabalho, devem dormir agora.
Gira a noite sobre suas invisíveis rodas
e junto a mim és pura como âmbar dormido...
Nenhuma mais, amor, dormirá com meus sonhos...
Irás, iremos juntos pelas águas do tempo.
Nenhuma viajará pela sombra comigo, só tu.
Sempre viva, sempre sol... sempre lua...
Já tuas mãos abriram os punhos delicados
e deixaram cair suaves sinais sem rumo...
teus olhos se fecharam como
duas asas cinzas, enquanto eu sigo a água
que levas e me leva.
A noite... o mundo... o vento enovelam seu destino,
e já não sou sem ti senão apenas teu sonho...

Completou:
- Pablo Neruda.

Ele sorriu meio tímido. Fez um gesto com a cabeça como se estivesse dizendo obrigado. Mas acho que deve ter dito eu te amo, pois sua “Florzinha” respondeu:
-Eu te amo, meu leitor.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Invasor

Na noite passada, quando dormia, percebi que a pessoa que invadiu meu coração estava tentando invadir também os meus devaneios.
Dei um forte tapa em meu rosto, despertei e disse a mim mesmo:
- Ninguém vai dormir o meu sonho.