Era domingo, 8 de março de 1998. Acordei às
5h, ainda estava escuro. Tomei banho. Saboreei o café feito com carinho pela
minha mãe, dei um forte abraço nela e em meu pai. Peguei a bolsa. Caminhei em
direção ao terminal rodoviário. Aquele jovem, que no dia anterior completara 18
anos, estava indo embora para Belém continuar seus estudos. Deixei família e
amigos e fui descobrir um novo mundo.
Hoje, 16 anos depois, moro em Aracaju
(Sergipe), no nordeste brasileiro, longe de Ourém, interior localizado no
nordeste paraense, há mais de 1.500km. Contudo, não tem distância que diminua o
amor que eu sinto pelo meu lugar, pela minha aldeia, pelo meu povo.
Dias atrás, sentado na areia da praia,
curtindo a brisa do mar e ouvindo o barulho das ondas, me peguei correndo na
Travessa Tembés, quando ainda não era asfaltada. A piçarra com suas pedras não
impedia que fizéssemos da rua nosso campo de futebol, de taco e de queimada. “Não
valeu o gol. Foi falta”, “Não derrubou a lata. Tem que derrubar”, “Você morreu.
Passe para o outro lado”, escutei os gritos que dávamos durante nossas
brincadeiras nas tardes ensolaradas ou chuvosas do Pará.
Olhando para a imensidão do Oceano
Atlântico me peguei nadando nas águas correntes do estreito Rio Guamá. Senti-me
caindo da boia no meio do rio, pulando do cais ou da ponte, correndo pelas
pedras da cachoeira, andando de canoa, comendo charque assado com farinha,
tomando cachaça 51 na escadinha e tirando o gosto com manga verde que derrubávamos
da velha mangueira que reinava imponente na beira do arrimo.
Um casal de adolescente caminhava na areia
da praia, vestiam o uniforme escolar. A moça de pele bronzeada soltou seu
enorme cabelo preto para balançar no ritmo do vento que arrastava as ondas.
Olhando pra eles me encontrei na Escolinha do Atlântico, atual Rubens Guimarães
Júnior. Foi lá que eu estudei da pré-escola à 3ª série do ensino fundamental.
Foi lá que eu descobri o mundo da escrita, do cálculo e da leitura. Meus primeiros
passos no mundo do saber acadêmico foram na escola que abrigava o Complexo
Esportivo da cidade, com o estádio de futebol que foi palco de tantas alegrias
proporcionadas nos clássicos entre Luiz de Moura e Liderança. Em seguida
lembrei da Escola Padre Antônio Vieira, onde estudei a 4ª série do ensino
fundamental, com seus corredores, muitas salas de aulas, uma campainha de
barulho forte e uma merenda escolar impecável preparada pela minha Mãe e suas
amigas-comadres Dona Direne, Dona Júlia, Dona Guiomar, Dona Joaquina e Dona
Maria do Aurélio. Aos poucos, cheguei à Escola Padre Ângelo Moretti, entrando
pelo portão que me dava acesso à 5ª série do ensino fundamental até o 3º ano do
ensino médio. Era um colégio enorme aos meus olhos e atravessar aquele portão
era símbolo de crescimento, estava deixando de ser criança. Deparei-me com um
lindo bosque, cheio de animais, mesas e bancos de madeira. Nessa escola avancei
pelo mundo do saber, descobri a complexidade dos números e letras aprendidas
nas séries inicias, viajei pelo mundo da ciência, descobri a história do homem
enquanto ser social e sua localização geográfica. Tudo isso conduzido por
professores fabulosos.
Levantei da areia e resolvi caminhar pelo
calçadão da orla de Aracaju. Cheguei ao ‘Mundo da Criança’, uma área cheia de brinquedos,
espaço onde a meninada se diverte. Lembrei do nosso modesto parque, localizado
entre a Igreja Matriz e a Praça Magalhães Barata. Era nosso palco de diversão.
Todos os sábados, após a Missa das Crianças, era pra lá que corríamos. Depois
de pular, girar, gritar, correr, íamos comprar guloseimas no Tio Dedê. O parque
deu lugar a um prédio da Ação Social, hoje quem faz estripulias por lá são os
idosos, e o Tio Dedê está vendendo bombons e caramelos para os anjos.
Andei em direção à minha casa. Continuei
com o pensamento em Ourém, relembrando os momentos que marcaram a minha vida,
ajudaram a formatar minha personalidade, permitiram ser quem eu sou. Posso
percorrer por vários lugares, mas percorro consciente de que tenho minhas
raízes fixadas em um lugar pequeno e aconchegante lá no interior do Pará. É de
lá que eu venho. É de lá que eu sou.
Nesses 252 anos de história tenho apenas
uma coisa a dizer: Ourém, como é grande o meu amor por você!
Aracaju
(SE), 29 de maio de 2014.